sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

4ª HISTÓRIA

Ainda estou na mesma escola ...

No Ano de 1975/76 fui convidada e aceitei ficar a pertencer ao Conselho Directivo da mesma escola. Éramos 5 elementos (1 Homem – Professor de Educação Visual – (Retornado ) e 4 Senhoras : 2 dos 4º grupo A e B, uma de Inglês e uma de Economia.
De gestão sabíamos todas muito pouco, mas talvez pela nossa ignorância fomos as únicas que assumimos o compromisso com garra total e inigualável.
De início … Tudo bem.
Fizemos as turmas;
Encontrão aqui, encontrão ali, elaboramos os horários,
Pusemos de pé o Ano Lectivo 75/76
( tal era a confusão exterior à Escola que o nosso trabalho parecia obra de magia ).

Tudo começou e corria, - para a época … razoavelmente bem
Chegou o final de Outubro ! Mas e o ordenados ? Há que pagar os ordenados. Fazer listas de vencimentos, preencher cheques …. IH ! Como vai ser isto ?
Aí, entramos mesmo em pânico!
Alguém imagina o que seria em plena época pós revolucionária, não se pagarem os ordenados a tempo ?
Nada mais há a fazer…
Chamaram-se os dois maridos economistas, mais a colega igualmente economista do Conselho Directivo e assim todos juntos passamos três noites e um fim de semana a trabalhar.
Faltou dizer que a secretaria tinha apenas a chefe, que um pouco como nós estava a “aprender” a viver numa nova era.
Éramos realmente todos muito novos, cheios de energia e vontade de mostrar bom trabalho. Tínhamos que marcar posição, perante as colegas, funcionários e nós próprias.
Conseguimos! Na véspera tudo ficou feito!
Meteram-se os cheques no cofre, todos conferidos e assinados e o Presidente fecha a porta e guarda a chave.

DIA SEGUINTE …
O Presidente é chamado a Lisboa de urgência para apoiar uma filha que chegara de África. Telefonou às 7h da manhã a avisar!
- Que sim senhor, vai descansado ! Está tudo bem ! Nós damos conta do recado.
Pois é ! Chegou a hora de abrir o cofre … E a chave ?
Ai … Está com o António algures perto ou mesmo já em Lisboa.
O pânico regressou. Uma das colegas que era doente, sobretudo muito ansiosa desmaia mesmo à porta do cofre, o que nos deixa a todos ainda mais confusos.
Que fazer? Era o último dia de pagamentos e mais ainda 5ª feira.
Tentamos “enrolar” o melhor possível os colegas alegando atrasos na autorização dos pagamentos, mas …
-Hoje sem falta vocês receberão os vossos cheques. Só pedimos que venham mais perto das 17h. – Dizíamos a todos, com o mais “aberto e seguro” dos sorrisos.
Enquanto isso um dos nossos maridos mete-se no carro e vai encontrar-se com o António, numa determinada estação de Lisboa e regressa de seguida, para que a nossa palavra fosse cumprida.
Que susto!
Mas foi assim que se formou uma equipa tão coesa, tão amiga e eficiente que parecia estarmos já a desempenhar estas funções há séculos.
Entre os elementos do Conselho Directivo criou-se uma empatia e uma cumplicidade que se estendeu às famílias directas proporcionando momentos de lazer fora do comum, muito pouco vulgares (repito isto sem dúvida 33 anos depois) dentro da classe docente.
Trocavam-se experiências profissionais, todos se ajudavam a todos os níveis e não existia qualquer divisão de classes sócio-económicas.
Uma das famílias por exemplo, estava a passar um mau momento económico. Apesar disso estava sempre presente nos nossos convívios, tinha a casa com o conforto possível porque todos nos empenhamos em proporcionar-lhe isso mesmo.
A senhora pela nossa mão e sem que a restante comunidade escolar sequer desconfiasse, começou a trabalhar para fora confeccionando salgados e bolos e ainda fazia arranjos de costura.
Os filhos … e eram muitos, continuaram os estudos, tinham as suas festinhas de aniversário e participavam em todas as outras.
Revigorou, ganhou de novo confiança, tornou-se uma família segura e feliz.
Convivemos durante bastante tempo, mas depois por uma razão ou outra fomo-nos separando fisicamente. A última notícia que tive foi do Algarve a comunicar a morte prematura do António com um cancro e a ascensão dos filhos na vida.
As aulas decorriam com bastante normalidade, mas um dia …



Será a 5ª História ... Até já!

4 comentários:

ARTISTA MALDITO disse...

Olá Licas

São estas histórias reais e humanas que nos fazem ainda crer em algo de bom, vê-se muita falta de coesão nas amizades, voa tudo com uma simples rabanada de vento. Nos locais de trabalho já é raro estabelecerem-se verdadeiros laços de amizade. E em vez de união cria-se é a máxima "cada um por si".

Beijinhos
Isabel

Licas disse...

Olá Isabel

Por acaso tive a sorte de encontrar (ou Criar) um belíssimo ambiente de trabalho. Orgulho-me disso. Saliento apenas pela negativa dois únicos anos. Ambos fizeram-me muito mal, porque eu não percebia o que se estava a passar à minha volta e ... era tão simples. Um colega para distrair os colegas da sua pessoa, lançou uma mentira na escola que me fez penar. Enquanto isso ele metia ao bolso uns tantos contos.
O pior é que descobri no ano a seguir e ele sofreu as consequências.

Mas dois anos em 30 de serviço pode-se considerar uma óptima % positiva.
Beijinhos
Até logo
Licas

Fátima André disse...

Licas, a história está excelente e muito entusiasmante. Até parece que entrei e vivi esses momentos. Mas na verdade não. Estive bem lá perto. Quando comecei a leccionar, um pouco mais tarde, em 1987, o ambiente na minha escola era excepcional, quase famíliar. Tenho pena que os professores da actualidade pouco saibam de colegialidade...
Beijinhos e bom fim de semana :))

Teté disse...

Por essa altura andaria eu no antigo 6º ano (actual 10º), mas bem me lembro das confusões que andavam no ar nesse período, depois de um "Verão quente" e a revolucionarite aguda no auge...

Bela recordação, de um tempo em que as pessoas se uniam para pôr em funcionamento uma escola (ou outra empresa a que se dispusessem). Por acaso acho que um bom ambiente é fundamental para as pessoas trabalharem ainda com mais gosto.

Beijinhos, Licas!