segunda-feira, 22 de março de 2010

SER PROFESSOR / JOÃO TORGAL



Li um texto subordinado ao tema "Ser Professor É" de João Torgal na "MESA DE CAFÉ" , um blog generalista de Coimbra

Tudo o que João Torgal relata é para mim uma realidade que precisa urgentemente de ser escamoteada e alterada para que possamos ter um futuro melhor, mais culto, mais justo e educado.
Porque o texto é extenso, indico-vos o caminho para que o leiam, reflictam e comentem.
http://amesadecafe.wordpress.com/2010/02/11/ser-professor-e/

Espero que aos poucos se agitem as consciências.

Deixem as vossas opiniões.
Obrigada

domingo, 21 de março de 2010

IRENA SENDLER



Uma senhora de 98 anos chamada Irena faleceu há pouco tempo.
Durante a 2ª Guerra Mundial, Irena conseguiu uma autorização para trabalhar no Gueto de Varsóvia, como especialista de canalizações.

Mas os seus planos iam mais além... Sabia quais eram os planos dos nazis relativamente aos judeus (sendo alemã!)
Irena trazia meninos escondidos no fundo da sua caixa de ferramentas e levava um saco de sarapilheira, na parte de trás da sua camioneta (para crianças de maior tamanho). Também levava na parte de trás da camioneta, um cão a quem ensinara a ladrar aos soldados nazis quando entrava e saia do Gueto.
Claro que os soldados não queriam nada com o cão e o ladrar deste encobriria qualquer ruído que os meninos pudessem fazer.
Enquanto conseguiu manter este trabalho, conseguiu retirar e salvar cerca de 2500 crianças.
Por fim os nazis apanharam-na e partiram-lhe ambas as pernas e os braços e prenderam-na brutalmente.
Irena mantinha um registo com o nome de todas as crianças que conseguiu retirar do Gueto, que guardava num frasco de vidro enterrado debaixo de uma arvore no seu jardim.

Depois de terminada a guerra tentou localizar os pais que tivessem sobrevivido e reunir a familia. A maioria tinha sido levada para aa câmaras de gás. Para aqueles que tinham perdido os pais ajudou a encontrar casas de acolhimento ou pais adoptivos.
No ano passado foi proposta para receber o Prémio Nobel da Paz... mas não foi seleccionada. quem o recebeu foi Al Gore por uns diapositivos sobre o Aquecimento Global.


Não permitamos que alguma vez, esta Senhora seja esquecida!!

sexta-feira, 19 de março de 2010

A TODOS OS PAIS


Ser pai é, acima de tudo, não esperar recompensas.
Mas ficar feliz caso e quando cheguem.
É saber fazer o necessário por cima e por dentro da incompreensão.
É aprender a tolerância com os demais e exercitar a dura
intolerância (mas compreensão) com os próprios erros.

Ser pai é aprender, errando, a hora de falar e de calar.
É contentar-se em ser reserva, coadjuvante, deixado para depois.
Mas jamais falar no momento preciso.
É ter a coragem de ir adiante, tanto para a vida quanto para a morte.
É viver as fraquezas que depois corrigirá no filho,fazendo-se forte em nome dele e de tudo o que terá de viver para compreender e enfrentar.

Ser pai é aprender a ser contestado mesmo quando no auge da lucidez.
É esperar.
É saber que experiência só adianta para quem a tem, e só se tem vivendo.
É agüentar a dor de ver os filhos passarem pelos sofrimentos necessários, buscando protegê-los sem que percebam,para que consigam descobrir os próprios caminhos.

Ser pai é saber e calar. Fazer e guardar. Dizer e não insistir.
Falar e dizer. Dosar e controlar-se. Dirigir sem demonstrar.
É ver dor, sofrimento, vício, queda e tocaia,jamais transferindo aos filhos o que, a alma, lhe corrói.

Ser pai é ser bom sem ser fraco.
É jamais transferir aos filhos a quota de sua imperfeição,
o seu lado fraco, desvalido e órfão.

Ser pai é aprender a ser ultrapassado, mesmo lutando para se renovar.
É compreender sem demonstrar,e esperar o tempo de colher, ainda que não seja em vida.

Ser pai é aprender a sufocar a necessidade de afago e compreensão.
Mas ir às lágrimas quando chegam.

Ser pai é saber ir-se apagando à medida em que mais nítido se faz na personalidade do filho,sempre como influência, jamais como imposição.
É saber ser herói na infância do seu filho, exemplo na sua juventude e amizade na idade adulta.
É saber brincar e zangar-se.
É formar sem modelar, ajudar sem cobrar, ensinar sem o demonstrar, sofrer sem contagiar, amar sem receber.

Ser pai é saber receber raiva, incompreensão, antagonismo, atraso mental, inveja, projeção de sentimentos negativos, ódios passageiros, revolta, desilusão e a tudo responder com capacidade de prosseguir sem ofender; de insistir sem mediação, certeza, porto, balanço, arrimo, ponte, mão que abre a gaiola, amor que não prende, fundamento, enigma, pacificação.

Ser pai é atingir o máximo de angústia no máximo de silêncio.
O máximo de convivência no máximo de solidão.
É, enfim, colher a vitória exatamente quando percebe que o filho a quem ajudou a crescer já não necessita dele para viver.
É quem se anula na obra que realizou e sorri, sereno, por tudo haver feito para deixar de ser importante.
(autor desconhecido)


Assim foi o meu Pai.
Lembro-me dele com muita saudade, carinho e gratidão

Obrigada Pai!

quarta-feira, 17 de março de 2010

ORAÇÃO DE UM IDOSO CONSCIENTE



Ó Senhor, tu sabes melhor do que eu que estou envelhecendo a cada dia.

Sendo assim, Senhor, livra-me da tolice de achar que devo dizer algo, em toda e qualquer ocasião.

Livra-me, também, Senhor, deste desejo enorme que tenho de querer pôr em ordem a vida dos outros.

Ensina-me a pensar nos outros e a ajudá-los, sem jamais me impor sobre eles, mesmo considerando com modéstia, que é pena não transmitir a sabedoria que acumulei.


Tu sabes, Senhor, que desejo preservar alguns amigos e uma boa relação com os filhos, e que só se preserva os amigos e os filhos quando não há intromissão na vida deles.

Livra-me, também, Senhor, da tolice de querer contar tudo com detalhes e minúcias e dá asas à minha imaginação para voar diretamente ao ponto que interessa.

Não me permitas falar mal de alguém.

Ensina-me a fazer silêncio sobre minhas dores e doenças..
Elas estão aumentando e, com isso, a vontade de descrevê-las vai crescendo a cada ano que passa.

Não ouso pedir o dom de ouvir com alegria a descrição das doenças alheias; seria pedir muito.
Mas, ensina-me, Senhor, a suportar ouvi-las com paciência.

Ensina-me a maravilhosa sabedoria de saber que posso estar errada em algumas ocasiões.
Já descobri que pessoas que acertam sempre são maçantes e desagradáveis.

Mas, sobretudo, Senhor, nesta prece de envelhecimento, peço:
Mantenha-me o mais amável possível.

Livrai-me de ser santo(a).
É difícil conviver com santos!

Mas um(a) velho(a) rabugento(a), Senhor,
é obra prima do diabo! Poupe-me, por misericórdia.

E proteja-me contra os mal intencionados....

Assim seja!
Amém !!!

segunda-feira, 15 de março de 2010

ESPECTÁCULO A NÃO PERDER

Uma boa forma de celebrar o DIA do PAI é assistir no Coliseu fdo Porto, pelas 21h30minutos, aos COSSACOS DO DON.


Don é o nome de um dos maiores rios russos. As suas margens foram cenário para o nascimento de tradições musicais muito próprias e originais. Os Cossacos de Don apostam na revitalização desse repertório histórico, transpondo para os palcos uma selecção rigorosa que é servida num ambiente de celebração em que a música e a dança nunca se descolam. O grupo Cossacos, coro folclórico mais antigo da Rússia nascido nos primórdios do século XIX (1811), é formado por mais de 80 elementos, entre cantores, bailarinos, músicos e outros artistas, todos eles trajados a rigor. Com sede em Rostov de Don (cidade situada no sudoeste da Rússia europeia), a companhia foi fundada em 1936, com o objectivo de preservar e difundir a cultura dos povos cossacos que durante os últimos 4 séculos ocuparam os territórios perto do Rio Don entre as fronteiras do Sul e do Este da Rússia.
Os Cossacos de Don reproduzem canções étnicas e as festas da região na sua forma original. As músicas são minuciosamente seleccionadas de um repertório histórico sempre acompanhadas de danças plenas de energia e de graciosidade. As canções abrangem temáticas muito variadas desde a alegria da festa de um casamento e a música de férias, até militares e lamentos pelas perdas, canções de guerreiros assim como canções cómicas da vida do povo.
A companhia é formada por um total de 80 pessoas: 30 cantores, 30 bailarinos, 14 músicos, e 6 directores. É integrada por artistas que cantam, dançam, tocam instrumentos tradicioanais e mostram a extraordinária riqueza do vestuário e uniformes cossacos, pois um dos maiores traços que os distingue de outras culturas são as suas tradições e costumes. Lenda e tradição fundem-se com a maior qualidade artística, por isso quando se fala de Cossacos do Don só uma palavra se pode evocar: espectacular, dito pelos críticos.
Até ao dia de hoje as habilidades cénicas do conjunto recebem elogios da imprensa nacional e estrangeira e de personalidades destacadas do mundo das artes. O temperamento, originalidade e habilidades do conjunto dos Cossacos conquistaram muitos países. Os seus espectáculos recebem aplausos entusiásticos nos EEUU, Japão, China, Austrália, México, França, Alemanha, Espanha, Noruega, Vietname, Coreia, Suécia, Portugal, África do Sul, Marrocos, Polónia, etc..

quinta-feira, 11 de março de 2010

MAIS UMA VEZ A CASA DA MÚSICA NOS OFERECE ...


A violinista japonesa Midori estreia-se amanhã, sexta-feira, na Casa da Música, no Porto, num concerto em que será acompanhada pela Orquestra Nacional do Porto, conduzida por Christian Arming. Serão interpretadas obras de Mozart, Bach, Schnittke, Schubert. A partir das 21 horas.

Midori debutou aos 11 anos com a Orquestra de Nova Iorque, sob a direcção de Zubin Mehta e aos 14 fez a sua primeira gravação para a editora Philips, onde tocou Bach e Vivaldi com a St. Paul Chamber Orchestra. A sua extensa discografia inclui nomes como Bernstein ou Claudio Abbado.

A violinista japonesa tem actualmente 39 anos e grava em exclusivo para a Sony Masterworks, que lançou dois álbuns seus em 2008. Em 2003, a Sony Classical lançou um CD com concertos de Bruch e Mendelssohn, gravados ao vivo com a Filarmónica de Berlim sob a direcção de Mariss Jansons, gravação que viria a ganhar o Deutsche Schallplattenpreis.

Neste programa, Midori interpreta três obras concertantes: "Concerto para violino e orquestra de cordas n.º 2, em Mi maior, BWV 1042", de Bach, "Sonata n.º 1 para Violino e Orquestra de Câmara", de Alfred Schnittke, e "Rondo para Violino e Cordas, em Lá M", de Schubert.

Neste concerto, a Orquestra Nacional do Porto interpreta, ainda, a "Sinfonia em Ré maior, KV111a", de Mozart, e a "Sinfonia n.º 8, em Si menor", Inacabada, de Schubert.

(J.N. - 11/03/2010 )

sexta-feira, 5 de março de 2010

UM NOVO DESAFIO

A Teresa do "Ematejoca Azul", muito gentilmente levou-me a aceitar este desafio, ao qual correspondo com amizade, certa de que me ficarão a conhecer um pouco melhor. Aproveiro para agradecer o selinho que a Teresa me enviou.



Assim:

1 — Mania

Não me deitar sem vir até ao computador despedir-me dos amigos

2 - Pecado capital

Ser muito sensível

3 — Melhor cheiro do mundo

O cheirinho das roupas dos meus netos

4 — Se o dinheiro não fosse problema

Faria com que todos à minha volta vivessem bem

5 — História de infância

Num domingo de verão, ia com os meus pais a pé pela Avenida da Boavista abaixo no sentido do mar. A alegria e vivacidade dos meus 4 anos levava.me a ir correndo sempre à frente. Por vezes parava e voltava para junto deles.
Como era uma criança sossegada e havia pouquíssima gente pela rua, os meus pais davam-me espaço.
A certa altura passei por um daqueles portões de uma enorme moradia...
Cheguei-me a ele e ... cedeu.
Vi que estava aberto.
Continuando com a brincadeira e para jogar às escondidas com os meus pais, entrei e bati com o portão com toda a força.
Coitada da Rita e do António ... correram, tentaram impedir-me, mas já era tarde.
A respiração quase lhes parou, quando de trás da casa surgem dois enormes cães.
O meu pai agarrou-se à campainha, enquanto a minha mãe tentava agarrar-me pela mão através das grades para que eu não corresse e assustasse os cães.
Eles vieram em correria desenfreada pelo quintal abaixo e perante o terror dos meus pais, ao chegarem perto de mim, sentaram-se um de cada lado calminhos como a proteger-me.
Enquanto isso, o meu pai continuava agarrado à campainha.
Uns minutos depois surgem duas empregadas um tanto despenteadas, que foram retiradas ao seu momento de sesta.

Tudo terminou bem ... porque ... sei lá porquê?

Hoje, 61 aanos volvidos, entro muitas vezes nessa casa para ir buscar o meu neto. A casa foi transformada num Jarim Infantil.

6 — Habilidade na cozinha

Transformar os restos num pitéu e o que sai mal num prato requintado.

7 — Frase preferida

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho

8 — Passeio para o corpo

Cortar a relva do meu refúgio campestre

9 - Passeio para a alma

Assistir a um concerto de piano

10 — O que me irrita

A mentira! A Ingratidão, A Injustiça e a Falta de Amor

11 — Palavras que mais uso

Não te importas
Por favor
Desculpa
Gosto de ti
Não te iludas

12 — Palavrões

Não consigo dizer palavrões... Se alguma vez o fiz foi em surdina

13 — Talento oculto

Não oculto nada

14 — Não importa que esteja na moda, jamais usaria

Uma minisaia

15 — Queria ter nascido a saber

Fazer os outros felizes e a defender-me dos outros (Não há meio de aprender e quando tento fazê-lo ... é uma desgraça!)

PASSO ESTE DESAFIO ÀS PESSOAS QUE VIEREM VISITAR-ME.
TEREI MUITO GOSTO EM CONHECÊ-LAS MELHOR. cOMO RECOMPENSA LEVEM TAMBÉM O SELINHO.

quarta-feira, 3 de março de 2010

AO PERFAZER UM MÊS QUE PARTIU



UM RASTO DE HORTELÃ



A ESCRITORA ROSA LOBATO DE FARIA PARTIU NO DIA 2 DE FEVEREIRO DESTE ANO 2010.
DEIXOU-NOS MUITAS RECORDAÇÕES, MATERIALIZADAS EM LIVRO, SÉRIES TELEVISIVAS E LETRAS DE CANÇÕES.
DEIXOU-NOS TAMBÉM ESTA AUTO-BIOGRAFIA, PUBLICADA EM 2008 NO JORNAL DAS LETRAS.

Publico-a aqui como homenagem e porque este texto traduz muitas das vidas da Mulher Portuguesa contemporânea da escritora,
Assim sendo, aproveito para fazer homenagem A TODAS AS MULHERES, cujo dia se celebra a 8 de Março.


"Quando eu era pequena havia um mistério chamado Infância. Nunca tínhamos ouvido falar de coisas aberrantes como educação sexual, política e pedofilia. Vivíamos num mundo mágico de princesas imaginárias, príncipes encantados e animais que falavam. A pior pessoa que conhecíamos era a Bruxa da Branca de Neve. Fazíamos hospitais para as formigas onde as camas eram folhinhas de oliveira e não comíamos à mesa com os adultos. Isto poupava-nos a conversas enfadonhas e incompreensíveis, a milhas do nosso mundo tão outro, e deixava-nos livres para projectos essenciais, como ir ver oscilar os agriões nos regatos e fazer colares e brincos de cerejas. Baptizávamos as árvores, passeávamos de burro, fabricávamos grinaldas de flores do campo. Fazíamos quadras ao desafio, inventávamos palavras e entoávamos melodias nunca aprendidas.
Na Infância as escolas ainda não tinham fechado. Ensinavam-nos coisas inúteis como as regras da sintaxe e da ortografia, coisas traumáticas como sujeitos, predicados e complementos directos, coisas imbecis como verbos e tabuadas. Tinham a infeliz ideia de nos ensinar a pensar e a surpreendente mania de acreditar que isso era bom.
Não batíamos na professora, levávamos-lhe flores.
E depois ainda havia infância para perceber o aroma do suco das maçãs trincadas com dentes novos, um rasto de hortelã nos aventais, a angustia de esperar o nascer do sol sem ter a certeza de que viria (não fosse a ousadia dos pássaros só visíveis na luz indecisa da aurora), a beleza das cantigas límpidas das camponesas, o fulgor das papoilas. E havia a praia, o mar, as bolas de Berlim. (As bolas de Berlim são uma espécie de ex-libris da Infância e nunca mais na vida houve fosse o que fosse que nos soubesse tão bem).
Aos quatro anos aprendi a ler; aos seis fazia versos, aos nove ensinaram-me inglês e pude alargar o âmbito das minhas leituras infantis. Aos treze fui, interna, para o Colégio. Ali havia muitas raparigas que cheiravam a pão, escreviam cartas às escondidas, e sonhavam com os filmes que viam nas férias. Tínhamos a certeza de que o Tyrone Power havia de vir buscar-nos, com os seus olhos morenos, depois de nos ter visto fazer uma entrada espampanante no salão de baile onde o Fred Astaire já nos teria escolhido para seu par ideal.
Chamava-se a isto Adolescência, as formas cresciam-nos como as necessidades do espírito, música, leitura, poesia, para mim sobretudo literatura, história universal, história de arte, descobrimentos e o Camões a contar aquilo tudo, e as professoras a dizerem, aplica-te, menina, que vais ser escritora.
Eram aulas gloriosas, em que a espuma do mar entrava pela janela, a música da poesia medieval ressoava nas paredes cheias de sol, ay eu coitada, como vivo em gran cuidado, e ay flores, se sabedes novas, vai-las lavar alva, e o rio corria entre as carteiras e nele molhávamos os pés e as almas.
Além de tudo isto, que sorte, ainda havia tremas e acentos graves.
Mas também tínhamos a célebre aula de Economia Doméstica de onde saíamos com a sensação de que a mulher era uma merdinha frágil, sem vontade própria, sempre a obedecer ao marido, fraca de espírito que não de corpo, pois, tendo passado o dia inteiro a esfregar o chão com palha de aço, a espalhar cera, a puxar-lhe o lustro, mal ouvia a chave na porta havia de apresentar-se ao macho milagrosamente fresca, vestida de Doris Day, a mesa posta, o jantarinho rescendente, e nem uma unha partida, nem um cabelo desalinhado, lá-lá-lá, chegaste, meu amor, que felicidade! (A professora era uma solteirona, mais sonhadora do que nós, que sabia todas as receitas do mundo para tirar todas as nódoas do mundo e os melhores truques para arear os tachos de cobre que ninguém tinha na vida real).
Mas o que sabíamos nós da vida real? Aos 17 anos entrei para a Faculdade sem fazer a mínima ideia do que isso fosse. Aos 19 casei-me, ainda completamente em branco (e não me refiro só à cor do vestido). Só seis anos, três filhos e centenas de livros mais tarde é que resolvi arrumar os meus valores como quem arruma um guarda-vestidos. Isto não, isto não se usa, isto não gosto, isto sim, isto seguramente, isto talvez. Os preconceitos foram os primeiros a desandar, assim como todos os itens que à pergunta porquê só me tinham respondido porque sim, ou, pior, porque sempre foi assim. E eu, tumba, lixo, se sempre foi assim é altura de deixar de ser e começar a abrir caminho às gerações futuras (ainda não sabia que entre os meus 12 netos se contariam nove mulheres). Ouvi ontem uma jovem a dizer, a revolução que nós fizemos nos últimos anos. Não meu amor: a revolução que NÓS fizemos nos últimos 50 anos. Mas não interessa quem fez o quê. É preciso é que tenha sido feito. E que seja feito. E eu fiz tudo, quando ainda não era suposto. Quando descobri que ser livre era acreditar em mim própria, nos meus poucos, mas bons, valores pessoais.
Depois foram as circunstâncias da vida. A alegria de mais um filho, erros, acertos, disparates, generosidades, ingenuidades, tudo muito bom para aprender alguma coisa. Tudo muito bom. Aprender é a palavra chave e dou por mal empregue o dia em que não aprendo nada. Ainda espero ter tempo de aprender muita coisa, agora que decidi que a Bíblia é uma metáfora da vida humana e posso glosar essa descoberta até, praticamente, ao infinito.
Pois é. Eu achava, pobre de mim, que era poetisa. Ainda não sabia que estava só a tirar apontamentos para o que havia de fazer mais tarde. A ganhar intimidade, cumplicidade com as palavras. Também escrevia crónicas e contos e recados à mulher-a-dias. E de repente, aos 63 anos, renasci. Cresceu-me uma alma de romancista e vá de escrever dez romances em 12 anos, mais um livro de contos (Os Linhos da Avó) e sete ou oito livros infantis. (Esta não é a minha área, mas não sei porquê, pedem-me livros infantis. Ainda não escrevi nenhum que me procurasse como acontece com os romances para adultos, que vêm de noite ou quando vou no comboio e se me insinuam nos interstícios do cérebro, e me atiram para outra dimensão e me fazem sorrir por dentro o tempo todo e me tornam mais disponível, mais alegre, mais nova).
Isto da idade também tem a sua graça. Por fora, realmente, nota-se muito. Mas eu pouco olho para o espelho e esqueço-me dessa história da imagem. Quando estou em processo criativo sinto-me bonita. É como se tivesse luzinhas na cabeça. Há 45 anos, com aquela soberba muito feminina, costumava dizer que o meu espelho eram os olhos dos homens. Agora são os olhos dos meus leitores, sem distinção de sexo, raça, idade ou religião. É um progresso enorme.
Se isto fosse uma autobiografia teria que dizer que, perto dos 30, comecei a dizer poesia na televisão e pelos 40 e tais pus-me a fazer umas maluqueiras em novelas, séries, etc. Também escrevi algumas destas coisas e daqui senti-me tentada a escrever para o palco, que é uma das coisas mais consoladoras que existem (outra pessoa diria gratificantes, mas eu, não sei porquê, embirro com essa palavra). Não há nada mais bonito do que ver as nossas palavras ganharem vida, e sangue, e alma, pela voz e pelo corpo e pela inteligência dos actores. Adoro actores. Mas não me atrevo a fazer teatro porque não aprendi.
Que mais? Ah, as cantigas. Já escrevi mais de mil e 500 e é uma das coisas mais divertidas que me aconteceu. Ouvir a música e perceber o que é que lá vem escrito, porque a melodia, como o vento, tem uma alma e é preciso descobrir o que ela esconde. Depois é uma lotaria. Ou me cantam maravilhosamente bem ou tristemente mal. Mas há que arriscar e, no fundo, é só uma cantiga. Irrelevante.
Se isto fosse uma autobiografia teria muitas outras coisas para contar. Mas não conto. Primeiro, porque não quero. Segundo, porque só me dão este espaço que, para 75 anos de vida, convenhamos, não é excessivo.
Encontramo-nos no meu próximo romance"


Rosa Lobato de Faria , entre outros escreveu os romances Flor do Sal, A Trança de Inês, Romance de Cordélia, O Prenúncio das Águas, ou mais recentemente A Estrela de Gonçalo Enes (ed. Quasi).